terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Tirando Dúvidas Litúrgicas

A Palavra do Senhor ontem, hoje e sempre

Monsenhor Guedes

No término do ano passado, a Igreja recebeu um grande dom das mãos do Santo Padre já ansiosamente aguardado. Trata-se da estupenda Exortação Apostólica sobre a Palavra de Deus na Vida e na Missão da Igreja que chega trazendo renovadas esperanças para a Sagrada Liturgia e para a vida da Igreja. A Palavra de Deus é que realiza toda e qualquer ação litúrgica: é por esta Palavra que o pão e o vinho se tornam Corpo e Sangue do Senhor na santa Eucaristia, os Sacramentos e Sacramentais acontecem e o tempo é consagrado pela Liturgia das Horas.
Estamos nos encaminhando para os cinquenta anos da aprovação da Constituição Sacrosanctum Concilium, sobre a Liturgia e quarenta e seis da Constituição Dogmática Dei Verbum, sobre a revelação divina. Estes dois documentos, verdadeiras luzes nestas quase cinco décadas, trouxeram todas as maravilhas presentes no Mistério Pascal realizadas hoje nas ações litúrgicas, que são o lugar excelente e indispensável da Palavra de Deus. Esta Palavra realiza o rito comunicador e atualizador do mistério celebrado.
Como anda a presença desta Palavra em nossas celebrações eucarísticas dominicais e festivas? Certamente o saldo de toda a Liturgia da Palavra é muito positivo, apesar da presença de algumas sombras densas que estão presentes e são maléficas. Parece não ter fim a má comunicação dos leitores no exercício de sua função. As melodias dos salmos são, às vezes, pouco inspiradas. Não basta apenas ler o texto indicado. No momento da Liturgia da Palavra, o Pai do céu quer falar com seus filhos e filhas reunidos no mesmo local. Afinal, aqui estão as duas maiores presenças na Celebração do Culto , no caso, a Santa Missa que são as pessoas e a própria Palavra. É inadmissível que Deus venha falar conosco e não conseguimos ouvi-lo porque o leitor não se preparou bem para tal função ou o som era de má qualidade. Falta, em nossos espaços celebrativos, a presença do ambão que não deve ser substituído apenas por uma simples estante. Este local é forte, sublime e santo. Sugiro aqui, uma aberta acolhida da Exortação Apostólica Verbum Domini do Santo Padre Bento XVI, principalmente quando, magistralmente, ele fala sobre a Liturgia, lugar privilegiado da Palavra de Deus nas páginas 105 a 135.
Com tristeza podemos constatar a presença do data-show no momento alto da comunicação de Deus com o seu povo durante as leituras na Liturgia da Palavra e do próprio Cristo presente no ministro ordenado na proclamação do Evangelho. É muito sério tirar do nosso povo o direito de utilizar os ouvidos e poder dizer: ‘’Fala Senhor que vosso servo escuta” para se ater à leitura dos textos bíblicos projetados numa tela colocada na sua frente.
Custa-me acreditar que o padre pároco não perceba que a assembleia está sendo iludida. Este é o momento da escuta. O argumento de que o som é deficiente e o leitor é fraco não merece crédito. A solução não é projetar os textos no telão, mas melhorar o som e preparar os leitores. Também, colocar os textos na mão do padre e do povo não é solução. Celebra-se este momento excepcional da Palavra deixando-A entrar pelos ouvidos tendo como destinatários nosso coração e nossa razão para os frutos acontecerem na vida.
Penso que não bastam os calorosos aplausos para a santa Palavra, decorar versículos e citar textos bíblicos. Podemos correr o risco de estarmos nos contentando apenas com exterioridades até bonitas e emocionantes. A Palavra de Deus é muito mais: Ela “se fez carne” (Jo 1, 14) e continua se encarnando no hoje de nossa vida.

E “as sombras” na Sagrada Liturgia?





Monsenhor Guedes

A Instrução Sacramento da Redenção da Sagrada Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos menciona que não faltam sombras na celebração da Santa Missa. Mas... quais são estas sombras, onde e quando encontrá-las?
Infelizmente, é sempre muito fácil alguém ver e comentar os “pecados litúrgicos” cometidos por pessoas do lado e vizinhas, sem a devida sensatez de correção dos nossos próprios erros. Também, é fácil “fechar os olhos” para os erros de pessoas dos nossos grupos e movimentos esquecendo-nos de que tais senões desaparecem, porque são cometidos por gente de nosso grupo, de nossa simpatia. É bem verdade também que, em alguns casos, faltam condições para realizarmos uma ação litúrgica, conforme esta mesma ação exige. Temos a lamentar, antes da enumeração de algumas deficiências ou sombras nas celebrações litúrgicas, principalmente na Santa Missa, Batizados e Casamentos, determinadas celebrações do Santo Sacrifício do altar transmitidas pela televisão. O fato de alguém ser famoso e possuir uma presença significativa na televisão não lhe dá o direito de ignorar a cadência e a pedagogia dos ritos. O rito fala e marca, porque é permanente. As pessoas nem sempre marcam, porque são passageiras.

Vamos recordar “algumas sombras”?

O lugar da celebração eucarística deve ser especial e sagrado. O direito canônico solicita que o Bispo local é quem deve avaliar a dignidade deste espaço celebrativo. Neste sentido, é bom lembrarmos que as nossas sacristias, secretarias e outras dependências pertencem ao todo do templo sagrado que são as nossas igrejas. Vale recordarmos, principalmente, após as celebrações da missa nas comemorações diversas, que aquele espaço continua merecedor de respeito e não é justo que o próprio altar sirva então somente como uma mesa comum. O som alto, o salmo mal cantado, o rebuliço dos ajudantes (?), a homilia muito demorada e sem conteúdo, o descaso com o ambão que, em alguns lugares, é substituído por uma simples estante, as hóstias consagradas em excesso, o que acarreta o necessário consumo das que restaram, após a distribuição da comunhão nas grandes concentrações, o data-show que transmite imagens virtuais competindo com o real e outras ações não recomendadas que acontecem, não são também sombras de que fala a Instrução Redemptionis Sacramentum?

E as Celebrações do Batismo e do Matrimônio?

Monsenhor Guedes

Não é difícil, em nossos encontros de pastoral em geral, o eterno clamor a respeito do despreparo das pessoas que procuram o Batismo das crianças Parece não ter fim tal clamor por ser verdade, já que este sacramento não é visto, por tais pessoas, como o primeiro dom proveniente da cruz e ressurreição do Senhor. O Batismo é dom excepcional do Mistério Pascal. É nossa plena inserção na Páscoa do Senhor. Somos cidadãos do céu e, se nascemos e morremos, morremos para ressuscitar.

Também encontramos, em nossas paróquias, um Caminho de Iniciação Cristã extremamente acanhado e deficiente com duas vertentes: de um lado, o rigorismo da lei sem um diálogo, pastoralmente afável através de um bom grupo de pessoas da pastoral do Batismo, e do outro lado, a falsa caridade pastoral que aceita e permite tudo.

As normas da Igreja são violadas e a comunhão pastoral é ferida por haver um atropelo nas mínimas exigências: pais e padrinhos que não apresentam o mínimo de esperanças para a futura educação cristã católica do batizando; pessoas de outras paróquias que não frequentam a igreja onde pedem o Batismo; crianças já crescidas que estão em idade de iniciar a Iniciação Cristã de crianças e adolescentes e até adultos que não seguem o caminho próprio da Iniciação à Vida Cristã.

Constatamos, também, por parte de celebrantes, o pouco domínio do próprio Ritual, o que acaba por provocar o empobrecimento da rica celebração do Batismo, como acontece na acolhida na porta da Igreja, nas várias adaptações aprovadas pela Sé Apostólica para o Brasil, no pleno conhecimento daquilo que o Ritual propõe para a celebração em etapas, no Batismo por imersão com maior riqueza ritual e em muitas outras possibilidades que, infelizmente, são desconhecidas. Uma nova leitura do próprio ritual vai fazer bem a todos os interessados.

O Sacramento do Matrimônio vem-se defrontando com a falta de fé das pessoas que batizadas, cresceram desprovidas desta virtude, razão e fundamento da vida cristã. É dispensável o relato pormenorizado do que acontece no caminho do processo matrimonial, da preocupação com a celebração e de tudo o que ela envolve. É urgente uma maior reflexão do padre, dos diáconos, das secretarias paroquiais e da pastoral familiar para a melhoria deste quadro deprimente. O Santo Sacramento do Matrimônio tem sido encarado como um ilustre desconhecido, em várias de nossas paróquias. Certamente, há ótimas exceções.

Alguns questionamentos poderão nos ajudar: como os noivos são acolhidos por nossas(os) secretárias(os) no ato de marcar o casamento e ao receberem as primeiras informações? O emprego de uma boa acolhida faz sempre muito bem. A preocupação com as regras, os valores monetários e todo o aparato externo não devem ser desprovidos de uma palavra amiga, centrada na Santa Palavra de Deus e da Igreja.

O padre participa do processo matrimonial, quando ele recebe os noivos na chamada “declaração dos noivos”, que integra os documentos exigidos. Esta é missão do padre e não dos diáconos ou de alguém da pastoral familiar. Todos os padres, principalmente, os párocos, agendam este compromisso que faz parte do seu ministério?

Os chamados encontros de preparação para o casamento possuem desafios preocupantes. Muitos noivos que, até agora, não cresceram na fé batismal não vão, a princípio, aderir a ela, em alguns dias ou horas de palestras e orações. Esta constatação aumenta mais nossa responsabilidade na criação de novos e maduros métodos para conseguirmos frutos mais seguros.

Quanto à celebração, algumas reflexões e até um exame de consciência devem ser feitos: até quando a vaidade e a falta de maduros critérios vão continuar a imperar nos atrasos, enfeites, fotografias, filmagens e nas atitudes dos mestres-de-cerimônias que atropelam a celebração, sem o mínimo de bom senso, equilíbrio e sensatez?

É muito comum o lamento na constatação destes acontecimentos. Será que não há solução? Até quando nossos templos, principalmente, os mais bonitos vão contemplar impávidos a repetição, em quase todos os sábados, destes eventos desprovidos de fé e respeito, mas bastante carregados somente de vaidade e bem próximos de um certo aspecto pagânico?

Por fim, há no ritual do matrimônio apêndices pouco conhecidos como: Rito para Bênção de Noivado, Bênção dos Esposos em Aniversário de Casamento dentro da Missa e os ritos adaptados dentro e fora da Celebração Eucarística.

Penso que é urgente mais estudos, reflexões sérias, coragem e maturidade pastoral para que o quadro atual seja revertido. Que Deus nos ajude.